29 janeiro 2013

Futre


Ele foi o "nosso" Maradona. Nesses "grandes estádios" que eram os recreios das escolas, não havia "derbi" entre turmas que não tivesse alguém a tentar imitar os movimentos de um ou de outro. Era indiscutivelmente o melhor jogador português do seu tempo, com um pé esquerdo fabuloso, e uma capacidade de drible em progressão tão explosiva quanto desconcertante. Paulo Futre, o menino de ouro do futebol português, ou tão simplesmente “El portugués” como ficou conhecido em Espanha. 

Nascido no Montijo, começou a sua carreira no Sporting, clube onde teve pouco tempo para brilhar. Em 1984, numa troca de “ofensas” de contratações de jogadores, o FC Porto acabou por ver partir Sousa e Jaime Pacheco para o Sporting, mas foi buscar a pérola maior dos leões. Com apenas 18 anos, Futre meteu-se num comboio e só parou em Campanhã. Três anos depois não foi um comboio, mas sim um Porsche amarelo a marcar a sua transferência… Mas nessas três épocas de azul e branco Futre chegou aos píncaros da Europa – período coincidente com o crescimento europeu do FC Porto. Futre era a “muleta” perfeita de Gomes no ataque da equipa comandada por Artur Jorge (no ano seguinte chegaria ainda Madjer, completando um trio de sonho). 


Num tempo muito menos mediatizado, só nas grandes competições europeias é que os jogadores se davam verdadeiramente a conhecer. Depois de milhares de arrancadas fulminantes, dribles estonteantes, golos e assistências para todos os gostos, Paulo Futre acabou por se valorizar a nível europeu sobretudo por um golo falhado. É ainda hoje um dos lances mais recordados da sua carreira - na final da Taça dos Campeões Europeus de 1987, em Viena, Futre arranca pelo lado direito do ataque, ultrapassa 6 jogadores do Bayern de Munique e remata com classe ao segundo poste... E a bola sai ao lado. Seria Madjer a grande figura dessa partida, mas o destino do "Paulinho" estava traçado. Depois de dois campeonatos e uma Taça dos Campeões Europeus (hoje Liga dos Campeões), Futre rumava a Madrid para o Atlético de Gil y Gil - o polémico presidente do clube. Foi através dessa transferência (então a mais cara de sempre do futebol português) que Futre recebeu um Porsche Amarelo que se tornou célebre e cuja história chegou até a ser utilizada recentemente em publicidade. 

No Vicente Calderón (Estádio do Atlético), Futre encantou a "afición colchonera" (adeptos do Atlético de Madrid) que o consideravam muito melhor do que os jogadores do rival Real Madrid. "É muito melhor do que aquele dos outros, o Butragueño." - lembro-me de ouvir de um adepto espanhol numa das muitas entrevistas de rua que se fizeram na altura, em Madrid, a propósito do jogador "portugués". 

Fica aqui um pequeno vídeo que mostra o que Futre representa para o Atlético de Madrid - passa-se em 1997 quando ele regressa ao Atlético (depois de muitas lesões), e os adeptos não deixam falar o presidente do clube cantando o nome do jogador português, porque só o querem ouvir a ele:


Futre sempre pareceu um miúdo a jogar, no sentido apaixonado do termo, sempre de olhos bem abertos,  a revelar por vezes alguma ingenuidade. Participou no México 86, onde se deu o "caso Saltillo" (que marcou um dos piores períodos de sempre da selecção portuguesa), e carregou vezes sem conta Portugal às costas (era Futre e mais 10) - isto numa altura em que os adeptos pouco queriam saber da selecção, constantemente dividida com "tricas" entre os três grandes (Benfica, Sporting e Porto). 

Tal como Maradona, jogou numa altura em que os grandes talentos não eram protegidos em campo, e a sua carreira poderia até ter sido mais longa, não fossem as lesões. Futre não pertenceu à geração de ouro do futebol português, mas foi ele sozinho o "menino de ouro". Não ganhou tantos troféus como podia ter ganho, mas talvez por isso, a sua aura de irreverência e até de jogador revoltado tenham sido a sua imagem de marca.

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